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domingo, 18 de janeiro de 2015

Avatar : A Lenda de Korra - Como estragar uma história e depois consertá-la (em tese)



Por Israel Guedes


Como o próprio nome sugere, Avatar : A Lenda de Korra é a série animada da Nickelodeon  que dá sequência à história de Avatar: A Lenda de Aang.

Ambientada 70 anos depois do antecessor, A Lenda de Korra  acompanha o Avatar depois de Aang: uma garota rebelde da Tribo da Água. Desde criança ela já domina os elementos terra, água e fogo. Agora precisa ir à Cidade República, metrópole onde receberá seu treinamento de dominação de ar de Tenzin, filho de Aang, o Avatar anterior, que deu fim à Guerra dos 100 anos.

Bryan Konietzko e Mike DiMartino criaram a série, que é dirigida por Joaquim dos Santos.

Com o grande sucesso de Avatar: A Lenda de Aang, seus criadores agora possuíam mais liberdade para ousar na próxima série, inclusive tratar de temas mais sérios, com uma ambientação mais madura. Possuíam também a difícil tarefa de dar continuidade ao sucesso de Aang e, quem sabe, superá-lo. Para tal foi optado por uma história totalmente diferente dos moldes de seu antecessor. Será que seus idealizadores estavam à altura do desafio?

Impressões Gerais

Sendo direto, a série tem muito altos e baixos. No quesito entretenimento ela cumpre seu papel, com uma história dinâmica, animação de encher os olhos e uma competente trilha sonora. Infelizmente as qualidades param por aí.

A história peca pelo fato de não passar de um entretenimento, pois é rasa, não apresentando uma mensagem ou objetivo. Há a falta de um único fio condutor unindo tudo. Os livros (como são chamadas cada fase) funcionam melhor isoladamente (o que não deveria acontecer). Deveria haver um ciclo, porém cada arco se concentra apenas em derrotar o inimigo da vez. Não temos sensação de unidade. Por mais que quisesse ter seus vilões de cada saga, deveria haver uma história maior por trás. Como isso não acontece tudo acaba soando superficial.

Como cada livro pareceu ser pensado individualmente, a seguir será feita uma análise de cada um deles.

Livro 1: Ar

Primeiramente, a sacada de transformar a personagem Korra e seus dilemas no exato oposto a Aang foi uma boa ideia. Trazendo algo de novo, pois, mesmo sendo uma continuação direta, não podemos apenas ver mais do mesmo.

Ao contrário do que muitos acham, não há motivo para apontar o fato de a trama estar presa à cidade República como um defeito, nem mesmo o ar moderno e tecnológico, que contrasta com o mundo em que Aang teve suas aventuras. Como foi falado, não pode ser mais do mesmo, pois 70 anos se passaram e novidades precisam ser apresentadas. Todos estes aspectos são bem explorados. O único motivo para desaprovar é devido à comparação com a série anterior. Assim como o clima mais sério e tenso não é um problema.

Até quase o final da temporada, a história se manteve muito bem, apresentando todo o contexto, os personagens e conflitos que deveriam ser desenvolvidos, ao mesmo tempo em que divertia e entretinha com as partes de ação.

Os personagens foram razoáveis, mas com poucos que realmente se destacam.

O romance apresentado foi prematuro e desenvolvido de forma afoita, tendo muito foco para algo que não era importante.

Korra não sofre nenhuma grande mudança. Não precisou passar por uma evolução ou mudar seu jeito para conseguir dominar o ar (fato que era enfatizado no começo), fazendo parecer que só o que faltava era uma situação de grande perigo, como tantas outras. 

O vilão Amon foi uma decepção. Um personagem de peso construído de forma competente que acabou perdendo a presença que possuía. O confronto final foi anticlimático, pois toda a ideologia de Amon a respeito de preconceito, opressão, que poderia gerar boas reflexões e conteúdo, foi jogada para o espaço e a história partiu para a ação seca.

Isto é algo que se repetirá nos próximos livros. A história sempre deixa claro que você não deve ir com a cara dos vilões, que não deve simpatizar com eles, mesmo que suas ideologias tenham alguma base boa. Se explorasse essa dualidade e fizesse os próprios personagens principais se indagarem do que é certo, as coisas funcionariam bem melhor, pois aparentemente a proposta é essa, mas nunca é desenvolvida além da superficialidade.

Korra recuperando sua dominação foi igualmente falho. Pareceu tudo tão fácil, um claro Deus ex Machina. Como falado, ela não precisou mudar para tal.  Seria bem melhor se a próxima fase da série fosse concentrada em sua busca para reaver as dominações perdidas. A história até mesmo deu a deixa perfeita para isso: a chave para recuperar as dominações poderia estar no mundo espiritual que é o foco do próximo livro.

Livro 2: Espíritos

Aqui A Lenda de Korra mostra o que tem de pior. 

Dá a impressão de que os responsáveis tomaram a decisão de fazer tudo ao contrário de A Lenda de Aang. Não seria ruim se isto não fosse aplicado também à estrutura narrativa, personagens, desenvolvimento, etc.

Por exemplo, um tema e desafio por livro; romance forçado desenvolvido às pressas; piadas excessivas nos momentos errados; preocupação e espremer muitos acontecimentos e reviravoltas em vez de se concentrar em poucas coisas e desenvolve-las com o cuidado necessário; múltiplos focos de narrativa que não acrescentam em nada à trama principal, e por aí vai...

Curioso como os espíritos, os quais deveriam ser fonte de sabedoria ou iluminação, no fim das contas não ensinam nada. Por que é tão pregada então a ação de se conectar com o mundo espiritual para adquirir sabedoria?

Ponto positivo do livro: conflitos familiares e política.

A melhor parte deste livro é a história do Avatar Wan, o primeiro de todos. E, coincidentemente, é a passagem que mais se assemelha ao estilo de A Lenda de Aang. Tal fato mostra que, pelo jeito, os autores decidiram se aventurar por um estilo que não é o forte deles e não conseguiram dominar, levando um tempo para a obra se encontrar, o que viria a acontecer nos livros seguintes.

Estruturalmente, este livro não é falho. Mas o fato de parecer uma aventura isolada tira parte da emoção, pois não sabemos onde a série está querendo chegar e parece que nem ela mesma sabe.

Em vez de tantas reviravoltas superficiais, deveria ter focado em menos coisas e as construído melhor, como o vilão, Unalaq. Ele aparenta ter uma causa nobre, assim como Amon possuía, e que também poderia ter sido trabalhada de modo digno, mas novamente foi deixada de lado, pois ele almejava poder e governar. Diferentemente do Senhor do Fogo em A Lenda de Aang, Unalaq não representava os pensamento de uma nação, nem mesmo conseguiu convencer ninguém com a falsa ideologia (nem a própria família) fora Korra, fazendo-o parecer apenas um louco solitário.

Neste livro Korra está menos marrenta, mas ainda não parece ter passado por grande mudança.

O romance continuou fraco. Não passa a emoção que deveria, parecendo mais uma novela mexicana com seu vai e vem.

O final com a luta de “Megazords” à lá Power Rangers foi triste. Não havia peso no confronto contra um vilão sem graça.

Livro 3: Mudança

Quem diria que as coisas poderiam melhorar.

Este livro chama atenção principalmente pelos momentos de ação, que em geral ficaram incríveis, com poucas exceções. Esta fase foi uma boa aventura.

Infelizmente o mundo espiritual perdeu totalmente o foco, sendo – juntos com os espíritos – usado como instrumento pela história. Na verdade toda a “magia” desaparece e “Mundo Espiritual” mais parece o nome de um zoológico, pois é só isso que se vê: vários bichos estranhos sem grande inteligência.

O maior foco na chefe Lin Beifong e seus conflitos familiares foi muito bem vindo, sem dúvida um dos pontos altos do livro. Dentre todos os personagens criados especialmente para A Lenda de Korra, é, sem dúvida, a mais interessante. E Mako, em contrapartida, definitivamente é o pior personagem. Sem graça, personalidade fraca, só possui relevância quando está nas suas idas e vindas no romance com Korra. 

Infelizmente os vilões continuam fracos (não conseguem fazer o publico torcer por eles com suas motivações inconsistentes) e os demais personagens sem evoluções notáveis.

O clímax foi mediano, mas a consequências dele foram bem vindas. O clima de desesperança com que o livro acabou, com Korra debilitada foi forte e tocante. E aqui há uma boa homenagem à Lenda de Aang que fãs de longa data irão gostar.

Livro 4: Equilíbrio

Com certeza o melhor dos 4.

O livro mais bem executado, com narrativas paralelas melhores e relevantes, personagens tomando mais atitudes por si mesmos, muitas vezes discordando uns dos outros.

O conflito de Korra é muito bom, mas depois que passa, novamente ela volta a ser a mesma de antes. Além disso, ela não ficou com sequela alguma dos eventos finais da fase anterior. Por que passou por tudo aquilo então?

A volta de Toph (personagem importante de A Lenda de Aang) sem dúvidas é uma das melhores coisas da temporada, roubando a cena sempre que aparece.

Por algum motivo, mesmo com uma guerra acontecendo, não há perdas significativas (não só neste livro, como na história inteira), o que acaba tirando qualquer sensação de perigo. Sim, houve uma morte no meio disso tudo, mas de alguém sem muita relevância.

Kuvira consegue ser uma vilã até competente e o confronto final é satisfatório.

A fatídica cena de encerramento polêmica não foi ruim. Já havia discretos indícios e fez sentido dentro da história.

A história se encerra, mas não é possível sentir o fechamento de um ciclo, pois não há uma história de fundo ligando tudo. Tal fato que poderia ser resolvido com o realojamento do Livro 2 para o fechamento da história, pois foi o que mais teve relação com a própria Korra e seu destino de Avatar. Claro que certas mudanças seriam necessárias, como construir melhor o vilão Unalaq e não concentrar todos os acontecimentos deste arco em um livro só, mas sim espalhado pelos demais arcos, dando mais a sensação de conexão e unidade.

Conclusão

As restrições a que os criadores da série estavam presos no desenho anterior aparentemente era o freio que impedia que o trem ficasse desgovernado. Com tanta liberdade as coisas acabaram sem rumo.

É uma pena que a Lenda de Korra não alcançou o padrão esperado, pois é cheia de conceitos e ideias muito boas. Felizmente, ela conseguiu se recuperar em seus momentos finais, mas fica a dúvida no ar:

Será necessária mais alguma lenda?